sábado, 30 de agosto de 2008

Queda do sentido

Poderia jurar-te aqui, ontem, que sou diferente.
Que a mim nunca me fugirá nada por entre os dedos. Nem o tempo feito de areia num relógio antigo, nem a vontade de estrangular a vida a cada segundo que jamais voltarei a viver.
Poderia jurar-te aqui, um dia, que tudo fará sentido.
Que nós faremos sentido. Que algures, entre o fim da tarde e a queda da noite e dos nossos corpos sobre ela, vou enlaçar os meus dedos nos teus e segurá-los com a mesma força com que segurava a ilusão de ser diferente e de ser meu cada pequeno grão de tempo.
Poderia jurar-te aqui, amanhã, que estarei cá.
Que não me fugirá a vida estrangulada por entre os dedos, dormentes, de tanto apertar os teus nos meus, nem a vontade de me manter assim, gangrenada. Que o amanhã não me trará cansaço e que a queda da noite não me esmagará contra ti e todos os dias iguais na sua diferença indiferente.
Poderia jurar-te aqui, hoje, que continuarei a fingir ser diferente.
Que enquanto a vida já moribunda me estrangular lentamente até à ponta dos dedos, eu continuarei a fingir que o tempo é meu e que a queda da noite em cima de nós, e a nossa em cima da vida, faz sentido.

O mais estranho dos marshmallows.


Receita

  • 3/4 de infinito abismo;
  • 1/3 de frases sem sentido;
  • 1 pacote de caos engelatinado;
  • 1/3 de uma chávena de confusão;
  • 2/3 de indecisão, inconformismo, inconsistência, incompreensão, insanidade;
  • 1/2 de olhares absortos para tudo e coisa alguma;
  • Uma pitada de palhinhas às cores;
  • 1 colher de realidade com extrato de ilusão;
O mais estranho dos marshmallows.